Imagens de Cristo – John Murray
Publicado em: 14 de janeiro de 2016 Por: Rev. Ageu Magalhães
A questão da propriedade das representações pictóricas do Salvador merece ser examinada. Deve ser concedido que o culto de Cristo é central em nossa santa fé, e o pensamento do Salvador deve, em toda instância, ser acompanhado com aquela reverência que pertence ao seu culto. Não podemos pensar nele sem a apreensão da majestade que é sua. Se nós não acolhemos o senso da sua majestade, então, somos culpados de impiedade e de desonrar o seu nome.
Deve também ser lembrado que o único propósito que pode ser servido por uma representação pictórica de maneira apropriada é que ela deve trazer a nós algum pensamento ou lição representada, consoante com a verdade e visando promover o culto. Desde já a questão é inescapável: a representação pictórica é um meio legítimo de conduzir a verdade e de contribuir para o culto que essa verdade deve evocar?
Estamos todos alertas quanto à influência exercida sobre a mente e o coração pelas imagens. Imagens são poderosos meios de comunicação. Quão sugestivas elas são ou para o bem ou para o mal e tudo o mais quando acompanhadas pelo comentário da palavra escrita ou falada! É fútil, entretanto, negar a influência exercida sobre a mente e o coração por uma imagem de Cristo. E se tal é legítimo, a influência exercida deve ser constrangedora para o culto e adoração. Afirmar qualquer desígnio mais baixo como que servido por uma imagem do Salvador seria uma contradição do lugar que ele deve ocupar no pensamento, afeição e honra.
O argumento para a propriedade das imagens de Cristo é baseado sobre o fato de que ele era verdadeiramente homem, que tinha um corpo humano, que era visível em sua natureza humana para os sentidos físicos, e que uma imagem nos ajuda a tomar uma estupenda realidade da sua encarnação, em uma palavra, que ele foi feito semelhança de homens e foi encontrado em forma humana.
Nosso Senhor teve um verdadeiro corpo. Ele poderia ter sido fotografado. Um retrato poderia ter sido feito dele e, um bom retrato, reproduziria a sua semelhança.
Sem dúvida os discípulos nos dias da sua carne tinham uma vívida imagem mental da aparência de Jesus e eles não poderiam deixar de ter retido esta recordação até o fim de seus dias. Eles nunca poderiam reter o pensamento nEle, pensar em como Ele peregrinou ao seu lado sem algo daquela imagem mental e não poderiam tê-la sem adoração e culto. As verdadeiras características que eles lembravam seriam parcela integrante da sua concepção acerca dEle, as reminiscências do que Ele foi para eles em sua humilhação e na glória da aparência da sua ressurreição. Muito mais pode ser dito a respeito do significado das características físicas de Jesus para os discípulos.
Jesus também está glorificado no corpo e esse corpo é visível. E também se tornará visível a nós em seu glorioso aparecimento: “aparecerá segunda vez, sem pecado, aos que o aguardam para a salvação” (Hebreus 9.28– ARA). O que, então, podemos dizer das imagens de Cristo? Primeiro de tudo, é preciso dizer que não temos quaisquer dados como base para fazer uma representação pictórica de Jesus; não temos descrições das suas características físicas que permitiriam ao artista mais habilitado fazer um retrato aproximado. Em vista da profunda influência exercida por uma imagem, especialmente nas mentes das pessoas jovens, devemos perceber o perigo envolvido em uma representação para a qual não existe nenhuma garantia, uma representação que é a criação da pura imaginação. Ela pode ajudar a destacar a tolice de perguntar: qual seria a reação de um discípulo, que realmente viu o Senhor nos dias da sua carne, diante de um retrato que seria obra da imaginação de alguém que nunca viu o Salvador? Podemos detectar facilmente qual seria a sua repulsa.
Nenhuma impressão que temos de Jesus deve ser criada sem os dados próprios da revelação, e cada impressão, cada pensamento, deve evocar o culto. Assim, visto que não possuímos dados revelacionais para uma imagem ou retrato no sentido próprio do termo, estamos impedidos de fazer uma ou de usar qualquer uma que tenha sido feita.
Em segundo lugar, as imagens de Cristo são, em princípio, uma violação do segundo mandamento. Uma imagem de Cristo, se serve a algum propósito útil, deve evocar algum pensamento ou sentimento a respeito dEle, e em vista do que Ele é, esse pensamento ou sentimento será de adoração. Não podemos evitar fazer da imagem um meio de culto. Porém, desde que os materiais para esse meio de culto não são derivados da única revelação que possuímos a respeito de Jesus, ou seja, as Escrituras, o culto é coagido por uma criação da mente humana que não tem garantia revelacional. Esse é o culto de si mesmo [i]. Pois o princípio do segundo mandamento é que adoramos a Deus apenas pelos meios prescritos e autorizados por Ele. É um grave pecado cultuar coagido por uma invenção humana, e isso é o que uma imagem do Salvador envolve.
Em terceiro lugar, o segundo mandamento proíbe curvar-se a uma imagem ou semelhança de qualquer coisa em cima no céu, ou embaixo na terra, ou na água debaixo da terra. Uma imagem do Salvador pretende ser uma representação ou semelhança dEle que agora está no céu, ou, pelo menos, dEle quando peregrinou na terra. É claramente proibido, portanto, prostrar-se diante de tal representação ou semelhança. Isso expõe a iniquidade envolvida na prática de exibir representações pictóricas do Salvador em locais de culto. Quando cultuamos diante de uma imagem do nosso Senhor, quer seja na forma de um mural, ou em tela, ou em vitrais, estamos fazendo o que o segundo mandamento expressamente proíbe. Isso se torna ainda mais evidente se tivermos em mente que a única razão pela qual uma imagem dEle deveria ser exibida em um lugar é a suposição de que ela contribuiria para o culto daquele que é o nosso Senhor. A prática apenas demonstra como quão insensíveis prontamente nos tornamos aos mandamentos de Deus e às incursões da idolatria. Possam as igrejas de Cristo estarem despertas quanto aos expedientes enganosos pelos quais o arqui-inimigo sempre procura corromper o culto do Salvador.
Resumindo, o que está em jogo nessa questão é o único lugar que Jesus Cristo como o Deus-homem ocupa em nossa fé e culto e o único lugar que a Escritura ocupa como a única revelação, o único meio de comunicação, a respeito daquele a quem cultuamos como Senhor e Salvador. A Palavra encarnada e a Palavra escrita são correlativas. Não ousemos usar outros meios de impressão ou de sentimento, mas aqueles da sua instituição e prescrição. Cada pensamento e impressão dEle devem evocar culto. Nós O adoramos com o Pai e o Espírito Santo, único Deus. Usar uma semelhança de Cristo como um auxílio ao culto é proibido pelo segundo mandamento tanto quando é proibido em relação ao Pai e ao Espírito.
(Reimpresso do Reformed Herald, Vol. XVI, nº 9. Fevereiro de 1961).
TRADUÇÃO LIVRE: Alan Rennê Alexandrino Lima
[i] NOTA DO TRADUTOR: Em Colossenses 2.23, o apóstolo Paulo usa essa expressão para falar do culto baseado apenas na vontade humana. Trata-se de uma adoração originada do coração, não das Escrituras.
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