Desabafo de uma Mulher Moderna

Publicado em: 5 de junho de 2015 Por: Rev. Ageu Magalhães

Por Ana Kessler

São 7hs. O despertador canta de galo e eu não tenho forças nem para atirá-lo contra a parede. Estou TÃO acabada, não queria ter que trabalhar hoje. Quero ficar em casa, cozinhando, ouvindo música, cantarolando…
Se tivesse filhos, gastaria a manhã brincando com eles, se tivesse cachorro, passeando pelas redondezas. Aquário? Olhando os peixinhos nadarem. Espaço? Fazendo alongamento. Leite condensado? Brigadeiro. Tudo menos sair da cama, engatar uma primeira e colocar o cérebro pra funcionar. Gostaria de saber quem foi a mentecapta, a matriz das feministas que teve a infeliz idéia de reivindicar direitos à mulher e por quê ela fez isso conosco, que nascemos depois dela. Estava tudo tão bom no tempo das nossas avós, elas passavam o dia a bordar, a trocar receitas com as amigas, ensinando-se mutuamente segredos de molhos e temperos, de remédios caseiros, lendo bons livros das bibliotecas dos maridos, decorando a casa, podando árvores, plantando flores, colhendo legumes das hortas, educando crianças, freqüentando saraus, a vida era um grande curso de artesanato, medicina alternativa e culinária. Aí vem uma fulaninha qualquer que não gostava de sutiã tampouco de espartilho, e contamina várias outras rebeldes inconseqüentes com idéias mirabolantes sobre ‘vamos conquistar o nosso espaço’. Que espaço, minha filha? Você já tinha a casa inteira, o bairro todo, o mundo aos seus pés. Detinha o domínio completo sobre os homens, eles dependiam de você para comer, vestir, e se exibir para os amigos, que raio de direitos requerer?
Agora eles estão aí, todos confusos, não sabem mais que papéis desempenhar na sociedade, fugindo de nós como o diabo da cruz. Essa brincadeira de vocês acabou é nos enchendo de deveres, isso sim. E nos lançando no calabouço da solteirice aguda. Antigamente, os casamentos duravam para sempre, tripla jornada era coisa do Bernard do vôlei – e olhe lá, porque naquela época não existia Bernard e, se duvidar, nem vôlei.
Por quê, me digam por quê um sexo que tinha tudo do bom e do melhor, que só precisava ser frágil, foi se meter a competir com o macharedo? Olha o tamanho do bíceps deles, e olha o tamanho do nosso. Tava na cara que isso não ia dar certo. Não agüento mais ser obrigada ao ritual diário de fazer escova, maquiar, passar hidratantes, escolher que roupa vestir, que sapatos, acessórios, que perfume combina com o meu humor, de ter que sair correndo, ficar engarrafada, correr risco de ser assaltada, de morrer atropelada, passar o dia ereta na frente do computador, com o telefone no ouvido, resolvendo problemas. Somos fiscalizadas e cobradas por nós mesmas a estar sempre em forma, sem estrias, depiladas, sorridentes, cheirosas, unhas feitas, sem falar no currículo impecável, recheado de mestrados, doutorados, e especializações.
Viramos super mulheres, continuamos a ganhar menos do que eles. Não era muito melhor ter ficado fazendo tricô na cadeira de balanço? Chega, eu quero alguém que pague as minhas contas, abra a porta para eu passar, puxe a cadeira para eu sentar, me mande flores com cartões cheios de poesia, faça serenatas na minha janela – ai, meu Deus, 7h30, tenho que levantar!, e tem mais, que chegue do trabalho, sente no sofá, coloque os pés pra cima e diga ‘meu bem, me traz uma dose de whisky, por favor?’ Descobri que nasci pra servir. Cês pensam que eu tô ironizando? Tô falando sério! Estou abdicando do meu posto de mulher moderna… Troco pelo de Amélia. Alguém se habilita? 
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